segunda-feira, 28 de julho de 2008

outras cores

Ontem, depois do almoço de domingo na casa da vó, fui até a horta colher bergamota e ameixa de inverno do pé para comer sob o sol. Dia tão lindo. Depois me sentei num banco e fiquei tentando sentir aquele momento como se fosse o último. Alento para dias que pareciam estar tão gris e estranhos. Pensei que quando era criança e brincava na grama daquele pátio as árvores pareciam tão maiores, tudo parecia ser tão mais perigoso e o tempo parecia passar tão mais devager! Tinha a impressão que seria eternamente aquela criança faceira...
Meu dia ganhou outras cores. Melhores até.
Fonte da imagem: http://spaces.live.com

quinta-feira, 24 de julho de 2008

não-porvir

Por vezes sinto-me como se tivessem me tirado o chão e me cortado as asas. Assim, caio num labirinto sem fim onde tudo encontra-se ao avesso e estranhamente absurdo. Desejos, sabores, cores que um dia foram freneticamente vibrantes e especiais, agora escorrem pelas superfícies e paredes de minha fértil imaginação.
Sempre fui assim. Dou-me por inteiro ao devaneio de tudo, nem que seja para depois me sentir assim como me sinto agora. Mas nunca espero o pior. Aí é que está.
Não gosto de nem uma das formas de pretérito, especialmente aquelas que lamentam o que poderia ter sido e não foi. Talvez por isso sempre me atire de cabeça. Felizes daqueles que conseguem ver essa loucura que é o mundo de suas breves redomas de razão e fazer de suas tolas humanidades partituras calculáveis do sentir.
Contando as horas para um não-porvir, sigo em meu silêncio cheio de palavras a serem ditas.
Fonte da imagem: http://ribeiranegra.blogspot.com

domingo, 20 de julho de 2008

em si


Este texto não tem um assunto específico. Ou melhor, seu assunto não é nada além dele mesmo. Ele é simplesmente ele. Faz-se ao avesso de qualquer outro texto que, com seus pequenos algarismos de significação justapostos, transcende a simples forma-palavra-corpo-signo, passando a existir além do universo do campo-documento. Este texto não discute valores intra-pessoais, tampouco quer elucidar formas de contribuir para a paz mundial, de melhorar a aliança desalenta entre os homens, ou o que quer que seja. Este texto não discute nem mesmo a ele próprio. Ele quer não se parecer com nada, existir em sua faceta sem significado. Este texto diz de tudo e ao mesmo tempo não diz de nada. Ele não (se) propõe (a) nada. Se fecha em si. Acaba nele mesmo, morde o próprio rabo. É o triunfo da endogenia - surge e termina nele. Não questiona nada, não proclama absolutamente nada, não ofende a nada, nem sequer almeja um resquício de carinho ou uma identificação plena capaz até de fazer emocionar o mais rijo coração. Não guarda nem um átomo de poesia, nem sequer de técnica. Não contribui, não desmerece, não cansa. Seu leitor não terá perdido nada depois de ler este texto, mas também não terá apreendido nada. A não ser que este texto guarda em si um silêncio. E que às vezes o silêncio, guarda em si ainda muitas palavras por dizer.

Fonte da imagem: http://www.10emtudo.com.br

quinta-feira, 17 de julho de 2008

vago



Vago
Vasto
Doce
Amargo
Tempo que se quis em mim pungente e atroz

Espero
Árduo
Mudo
Calo
Coisa que se fez destino e fugaz

Ciclo
Tolo
Curo
rondo
Espreito um divino louco e letal


Agora se faz sentido e tarde.
Tarde demais.

Mesmo!


Imagem: Cristian Mossi

questão


Tenho devorado ultimamente um livro chamado “O que vemos – O que nos olha” (1998), de autoria de um francês com o simpático nome (para não conceder-lhe outro adjetivo) de Didi-Huberman.
Este, além de ajudar muito a pensar questões filosóficas acerca de meu trabalho de mestrado, tem me feito refletir sobre diversas outras coisas que se apresentam em meu cotidiano e que por um ou outro motivo deixo escapar por entre os dedos.
De tudo, uma frase parece martelar mais que as outras em meus pensamentos: “Como mostrar um vazio? E como fazer desse ato uma forma – uma forma que nos olha?”


Fonte da imagem: http://confrariadoatum.blogspot.com

quarta-feira, 16 de julho de 2008

isto sim

Criar um instante. Isto sim. Tempo de olhar-me com mais calma, de ouvir-me com mais calma, de pensar com mais calma, de seguir com os olhos e a ponta dos dedos os desenhos novos que se formaram lentamente em meu corpo e que o corre-corre de sempre nem me deixou perceber.
O existir desencadeia normas. Estas, seguidas à risca, nos fazem esquecer do espectro furtivo e difuso que se apresenta todas as manhãs no espelho. Faz-nos enredar por caminhos pelos quais não é possível alçar vôo, nem mesmo escutar aquela música favorita, gritar “Eu te amo!” na hora que queremos, ou ainda pensar (com a plenitude e a gravidade que isso acarreta) só em nós mesmos. Por um único e mísero momento. Um fragmento inventado. Nem que seja! Isto sim. Isto sim...

Imagem: Cristian Mossi

segunda-feira, 14 de julho de 2008

oxalá

Oxalá, me passe a dôr de cabeça, oxalá
Oxalá, o passo não me esmoreça;

Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá,
Oxalá, o povo nonca se esqueça;

Oxalá, eu não ande sem cuidado,
Oxalá eu não passe um mau bocado;
Oxalá, eu não faça tudo à pressa,
Oxalá, meu Futuro aconteça

Oxalá, que a vida me corra bem, oxalá
Oxalá, que a tua vida também;

Oxalá, o Carnaval aconteça, oxalá
Oxalá, o povo nunca se esqueça;

Oxalá, o tempo passe, hora a hora,
Oxalá, que ninguém se vá embora,
Oxalá, se aproxime o Carnaval,
Oxalá, tudo corra, menos mal

(Madredeus, composição: Pedro Ayres Magalhães)

Imagem: Cristian Mossi

domingo, 13 de julho de 2008

Valsa para Bruno Stein

Deste fascinante, forte e indescritível filme, que apresenta belas paisagens de Caçapava do Sul/RS, o que fica é a frase: "É preciso ter coragem para ser feliz..."

Fonte da imagem: http://tv.gramadosite.com

meu enredo

Quanto tempo ainda tempos para dizermos do amor?
E se o outro não me escuta, como dizer-lhe do que sinto?
E eu, será que o escuto plenamente?
Será que minha vida é formada por micro-cenas que, justapostas ao som de uma bela música, formariam um fascinante trailer de longa-metragem?

Quando descobrirei?

Fonte da imagem: http://byebyemother.blogspot.com/

sábado, 12 de julho de 2008

na espreita de um instante


Só hoje pude dar-me conta disso. A câmera dos meus olhos difusos não apreende tudo que se oferece ao meu redor. Ela seleciona enquadramentos, detalhes, movimentos que só eu vejo.
Ao caminhar, o faço em somente uma direção. Posso (e devo) mudá-la vez em quando, é claro, mas assim que a mudo, ela passa a ser única. Sou insubstituível em meu trajeto.
Carrego tantas coisas. E estas são somente minhas, de mais ninguém. Ainda que volta e meia apareça algum anjo bom disposto a compartilhar o fardo.
Escrevo cartas para mim mesmo que nem eu depois entendo...
O lugar.
O ato.
O instante-momento em que a brisa acaricia-me o rosto e que no depois distante não poderei mais estar.

Imagem: Cristian Mossi em cima de fotografia de Angélica D'Avila

tolo

Estrelas não tardam a surgir em mim.
E me armo assim todo!
Desejos, espelhos e minhas verdades...
Pra dar de cá ao mundo,
Um tolo fragmento da própria imagem.


Imagem: Cristian Mossi

antes que amanhã

Sei que nada será como antes, amanhã
Que notícias me dão dos amigos?
Que notícias me dão de você?
Sei que nada será como está
Amanhã ou depois de amanhã
Resistindo na boca da noite um gosto de sol...

(Trecho de 'Sei que nada será como antes', por Milton Nascimento e Ronaldo Bastos)

Fonte da imagem: http://flickr.com/

quarta-feira, 9 de julho de 2008

silêncio

quero vida nada,
tenho tu a ser mim tava,
fera lingua fere,
só aqui que espera cala,
tempo mudo tempo
até saber que tudo
não é nada
Fonte da imagem: Pintura de Joan Michell, disponível em http://www.kemperart.org

entre

Sinto-me por vezes afoito em revelar este universo em mim. Permaneço imóvel. As idéias rondando-me a mente como mariposas cegas ao redor da lâmpada acesa em meio a madrugada. Não sei. Simplesmente não sei o que escrevo, quando a vontade é de gritar... De fazer, orgulhosamente e egocentricamente que o mundo perceba o que sinto. Quase sempre é tão fácil irromper o campo vazio com pequenas significações. Porém há momentos em que as palavras nos traem e tudo o que sentimos se transforma em um gás denso e etéreo. Uma suspensão de idéias que paira o entre de nossa materialidade e reflete em uma não-consciência de nós mesmos. Um estado de ilusão.

Imagem: Cristian Mossi

terça-feira, 8 de julho de 2008

Sempre precisei
De um pouco de atenção
Acho que não sei quem sou
Só sei do que não gosto...
E nesses dias tão estranhos
Fica a poeira
Se escondendo pelos cantos...
(Teatro dos Vampiros, Legião Urbana)

global

Prefiro café a chá.
Mas sou muito mais dos orientais que dos norte-americanos!

Fonte da imagem: http://www.dominiosfantasticos.xpg.com.br

segunda-feira, 7 de julho de 2008

...invade e fim*


A vida me entra pelos poros,
pelos olhos,
faz arder meu nariz,
enrijesse minha saliva,
acelera meu coração...

Passa.

*título retirado da música Pétala de Djavan

Imagem: Cristian Mossi

tramas do outro

Mais que sempre tenho prestado atenção nas pessoas.
Descubro tantas coisas com elas, cada uma a seu jeito.
Encontro sim uma dificuldade em adentrar o profundo de seus olhos...
Mas não desisto!
Percebo que já não espero de todos ‘tudo’ que quero, mas o que podem me dar.
Talvez esteja amadurecendo e nesse processo aprendo que também não sou ‘tudo’ para o outro.
E erro.
E acerto.
E machuco e me machuco.


E me encontro para depois me perder.


Imagem: Cristian Mossi

sexta-feira, 4 de julho de 2008

delicadeza cruel

A sutileza presente na carcaça fria das palavras, às vezes dói. Não porque a palavra, própria, ela assim em sua aparência revestida de corpo-signo se faça machucar gratuitamente, mas porque de fato ela dói uma dor que não se entende. Dor de quem a espreita ingenuamente. Penetra seus retornos. Infere seus tracejados, seus acentos, seus pontos e remeche a ferida aberta. Às vezes abre feridas que nem existiam , mas que a palavra, essa delicadeza cruel, consegue impor. Ninguém sabe o que esconde o véu sórdido das palavras, nem sabe por que ela tanto dói. Só se sabe que ela se faz doer nos momentos mais impróprios e que pode se apagar em matéria, mas sua marca se reveste de uma dor mais doída e mais imprópria, que só aumenta com o passar do tempo. Espécie de rancor. A palavra: melhor imagem do diabólico. Tão atraente e tão traiçoeira quanto se pode imaginar.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Chove Chuva

Dois dias fora de Santa Maria e quando chego,
aqui está ela a me recepcionar...
A chuva!
Me faz lembrar daquela música especial cantada lindamente pela Zizi Possi...
"Você sabe o que é a chuva meu bem
é uma princesa que cai do céu
é a tristeza em forma de véu
Quando os teus cabelos
forem iguais aos cabelos da chuva meu amor
então vou gritar de felicidade
porque gosto muito da chuva e de você."
(Chuva Princesa, Jorge Mautner)

Entardecer no Guaíba

Os demais extremo-oestes dos olhares despercebidos do mundo que me perdoem, mas em Porto Alegre, de fato, temos o mais belo pôr-do-sol que já se ouviu falar... Parece clichê repetir isso, mas só quem pôde alguma vez presenciar o momento em que a 'brasa escaldante' encontra o Guaíba a tardinha, é que entende a frase de Kleiton e Kledir em Horizones: "E um pôr-de-sol me traduz em versos...."

Fonte da imagem: http://nadademuitointeressante.blogger.com.br

Iberê Camargo



O que são nossas carnes dispostas ao tempo?
E o que nos dizem os objetos fora de nós?
O que realmente está fora de nós?
Questões que me fiz ontem, quando tive a oportunidade de conhecer a Fundação Iberê Camargo em Porto Alegre/RS que traz em sua primeira exposição uma retrospectiva fantástica desse artista, com curadoria de Mônica Zielinsky, Paulo Sérgio Duarte e Sônia Salzstein.
Além da construção magnífica e imponente a beira do Guaíba, assinada por Álvaro Siza e premiada na bienal de Arquitetura de Veneza (2002), a fundação/museu recebe na mostra inédita pinturas, gravuras e desenhos de Iberê, os quais mostram em seu conjunto a violência sutil com que o artista tratava suas temáticas que vão da paisagem, perpassando os carretéis e a figura humana, tudo combinado a uma carga existencialista que beira a morbidez e a ironia presente nas coisas do mundo as quais não escapam à passagem do tempo e do olhar.
Fonte das imagens: