sábado, 30 de agosto de 2008

exercício de estranhamento

1ª fase (básica)

*Sente em um lugar movimentado e barulhento;
*Coloque o mp3 nos ouvidos no modo “reproduzir todas as músicas aleatoriamente”;
*Observe as pessoas movimentando as bocas sem emitir qualquer som e a vida acontecendo silenciosa, tendo por fundo musical somente o que toca a todo volume só para você;

2ª fase (avançada)

*Imagine a música que toca como a trilha sonora dos eventos que acontecem paralelamente. Sinta-se vivo. Tente não pensar em outro lugar, pelo contrário sinta-se o máximo possível onde você está, na situação em que você está;
*Perceba o quanto as coisas parecem ser lindamente estranhas. Frágeis. Perceba o tempo passando por suas veias e os soluços de segundo que simplesmente não param de sussurrar que você está envelhecendo e que tudo o que há ao seu redor não tarda a se desfazer.

A vida é um mistério que não precisa de explicações, mas de questionamento constante...


Imagem: Fotografia de Angélica D'Ávila sobre trabalho de Cristian Mossi

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

astral

Não. Este blog não está abandonado!
Simplesmente ando sem muita vontade de escrever, ou mesmo de procurar uma imagem, um fragmento de música, ou seja lá o que for que tem preenchido esses espaços vazios e inocentes, desde Junho desse ano.
Nada grave... Bem pelo contrário. Ando me sentindo tão bem, tão animado, com a auto-estima lá nas nuvens e uma vontade de chorar daquelas boas, de quando não cabe mais tanta felicidade dentro do peito pelas coisas mais bobas possíveis. Nem um motivo especial... Só uma overdose de ‘boniteza’ da vida... Quase uma depressão profunda às avessas, sem um dispositivo aparente.
Não sou adepto àquelas teorias masoquistas que confiam no ‘fundo do poço’ os dispositivos ideais para criar qualquer coisa que seja. Nem pensar! Mas tenho percebido que quando estou muito bem, quase não passo por aqui...
Quando decidi finalmente iniciar esse espaço, prometi a mim mesmo que não iria me cobrar e que este seria um lugar para depositar os (des)enredos que servem de fundo na difícil tarefa de fazer dessa loucura que é a vida, um lugar pelo menos um pouco mais agradável. Então... fica registrado (o que eu poderia chamar de) um bom momento... E se eu pudesse escolher uma frase para ilustrar, seria aquela de uma das músicas dos Secos e Molhados (que por acaso escuto agora):
“Todas as cores e outras mais, procriam flores astrais...”


Fonte da imagem: Andy Warhol, disponível em http://www.passeiweb.com


sábado, 16 de agosto de 2008

reminiscências


Surge em mim uma nesga de sol...
E entre desconcertos e (des)enredos,
ainda prefiro seguir como se não houvesse lembranças.
Reminiscências que insistem em despontar sem pedir licença.
E duelam docemente com os sorrisos fáceis que se desenham pouco a pouco, mais e mais. Multicolorido. Exatamente (diferente) e igual.

Imagem: Cristian Mossi

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

ilusão

"...o tempo é que vai passar,
a gente só vai rodar,
na mesma ilusão
de recomeçar..."

(Ter que esperar/ Paula Leal - Chicas)

Imagem: Cristian Mossi

suspensão

Suspender um sentimento não é tentar esquecê-lo. Pelo contrário, é colocá-lo em um novo patamar, prolongar sua sonoridade, mantendo-o longe do agreste de nossos intempestivos e incrédulos corações.
Suspender um sentimento é como guardá-lo, cuidadosamente, deixar amadurecê-lo pouco a pouco e esperar que, em sua redoma de intemporalidade, sussurre dia a dia a (in)existência contínua que reveza a força e o vazio das horas.
Suspender um sentimento é descolá-lo do tempo que transforma tudo em coisa – nenhuma. E ri, debochando de nossos infortúnios, humanidades tolas, breves, suspensas também em um código de automatismos que não deixam os sentimentos serem senão suspensos. Senão escravos da razão. Dos limites que ela desenha e redesenha na caminhada sutil, no movimento da areia infinita.
A vida me surpreende mais e mais, a cada novo dia, quando tira e repõe esperanças em minhas mãos, tanto quanto desapossa uma criança de um brinquedo, ou de um doce. Tolices que me fazem crédulo e triste. Mas também que me fazem acreditar que é isso e pronto. Que não há o que ser feito. Que não há mais presente, mas um futuro que dirá o que quer ser.
Por isso suspendo o que sinto como um cristal precioso e único. E fito-o, com uma posição de cuidado e desagrado, tal como o menino que quer voar e, desalento, olha o pássaro e questiona-se do porquê daquela magia... Afinal ela soa tão simples e fácil!
Sigo em minha coleção de cristais e sentimentos suspensos, guardados, mofados, alguns que perdem com o tempo o brilho, outros que reavivam-no mais e mais. Serei eu uma suspensão de vida? Ou será o segredo da vida uma suspensão de instantes que pululam em nosso cotidiano? Nem me atrevo a tentar encontrar a resposta...

Imagem: Cristian Mossi

domingo, 3 de agosto de 2008

de si

Sento-me. Começo então a tecer meus longos mantos de palavras. Não há o que possa ser tão avassalador quanto o universo de signos a pulular em minha mente, a entrar-me e sair-me pelos sentidos, a permitir-me embrenhar por breves significações perante o mundo, sobre todas as coisas que existem e se estendem ao nada. Visíveis, invisíveis. Faço, desfaço, refaço cada ponto, cada trama, cada labirinto de idéias, em todo e qualquer lugar. Vomito devaneios tolos, regurgito incertezas, calculo o som da voz que repassa (ainda que só) a estrada. Depois esqueço. Perco-me onde só há a ausência, onde não posso ver início nem final. Acaricio-me lentamente tentando com isso encontrar um sentido estúpido. É o que há por fazer.

Imagem: http://gruposeismaisum.blogspot.com

resquícios

Do tanto que sinto, o que resta é a embriaguez, a vertigem, o vazio das horas. Plenas. Momentos tecidos melindrosamente por resquícios de sonho e vida. Uma ardência que fere os dedos, os olhos, a lembrança, a esperança, a vontade de seguir em frente, mesmo que em passos lentos e ponderados.
Agora o que sobra é o gosto amargo, movimentos ritmados, de um tempo automático e sem modos de percepção plena das coisas. É um soluço, um filme sem roteiro, um nada-a-mais.

Posso então ver o mundo por janelas diferentes.


Imagem: Cristian Mossi